Rabino Michel Schlesinger propõe diálogo
entre religiões em livro
'Diálogos de um Rabino' prega tolerância entre judeus e fiéis de outras
doutrinas
José Maria Mayrink ,
O Estado de S.Paulo
28 Julho 2018 | 16h00
Conflito de ideias
sem confronto entre os interlocutores é para o rabino Michel Schlesinger, da
Congregação Israelita Paulista (CIP), o segredo do bom entendimento na
diversidade. Judeus podem e devem se dar bem com cristãos, muçulmanos e
seguidores de outras crenças, os budistas, por exemplo, sem prejuízo das
convicções de cada um. Essa tese, vivida na prática do dia a dia, é a chave de Diálogos de um Rabino, ou Reflexões para um Mundo de Monólogos,
como diz o subtítulo do livro, lançado pela Annablume Editora.
São 38
capítulos com a transcrição de prédicas de Schlesinger feitas na sinagoga para
sua comunidade. Endereçadas aos judeus, estendem-se a toda a sociedade, pois
tratam de temas não só brasileiros, mas universais. Religiosidade, ética,
justiça, direitos, filosofia, teologia, psicologia, literatura, história,
santidade, tudo sob a óptica judaica, mas abrindo-se em um leque amplo e
generoso que abriga outras religiões e ideologias leigas. Deus aparece em cada
página, mesmo que sua presença se faça sentir só pelo sopro de uma brisa, como
nos livros da Torá, o Pentateuco da Lei de Moisés.
Como é
tradição na pedagogia dos rabinos, Schlesinger conta histórias, anedotas e
pequenas parábolas para fazer ouvintes e leitores compreenderem bem os seus
diálogos ou monólogos. Como o público é primordialmente judeu, ele usa com
frequência palavras e sentenças em hebraico, que no livro são traduzidas e
explicadas à margem do texto. Identifica também, no tempo e nas correntes
ideológicas, alguns sábios do judaísmo citados ao longo dos capítulos. Diálogo
e respeito à diversidade de opiniões são preocupação constante. Como povo
eleito, observa o rabino da CIP, os filhos de Israel não são superiores a
outras nações. “O não judeu é para nós um ser humano de igual importância com
crenças diferentes.. Para nós existe um único Deus, mas há diversos caminhos
legítimos para se chegar até Ele”, ensina Schlesinger.
“Diálogos de um Rabino parte de
uma perspectiva judaica. No entanto, a partir dela, pretende conversar com
desafios essencialmente humanos e, portanto, universais”, diz Schlesinger. Ao
refletir sobre o diálogo consigo mesmo, ao longo dos capítulos que falam do
diálogo com Deus, com o mundo, com nossos pais, com o próximo e do diálogo “com
o outro que vive em mim”, o rabino alerta sua comunidade com um conselho
surpreendente. “Penso que todo judeu deveria se converter ao judaísmo.
Recomendo que judeus se apropriem de sua identidade com responsabilidade”. Ou
seja, que o Povo Eleito não se esqueça de seu pacto com Deus, da aliança dos
Filhos de Israel que foram escolhidos porque antes aceitaram a Torá. O conselho
vale tanto para os religiosos como para os não praticantes.
Os judeus são cerca de 120 mil no Brasil, 50% deles em São Paulo.
Mais de 600 pessoas participaram do lançamento do livro na sinagoga. Um debate
entre Schlesinger e o professor Mario Sergio Cortella, filósofo e escritor de
formação católica, abriu o evento, com uma discussão em torno dos temas
abordados pelo rabino em suas prédicas. Autor do prefácio do livro, Cortella
salientou os valores que aproximam judeus, cristãos e muçulmanos, apesar das
diferenças que marcam as três religiões monoteístas. Ao prefácio do filósofo
soma-se um texto do cardeal arcebispo de São Paulo, d. Odilo Pedro Scherer.
Não surpreende essa colaboração tão próxima, pois
Schlesinger é também o representante da Confederação Israelita do Brasil
(Conib) para o Diálogo Inter-religioso. Sucessor do rabino Henry Sobel na CIP,
ele tem 41 anos de idade e 13 de rabinato. Casado com a antropóloga Julliana
Portenoy, Schlesinger é pai de duas filhas, Tamar e Naomi.